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Artigo: Alteração do nome e a mutabilidade extrajudicial – insegurança ou efetivação de direitos fundamentais?

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José Luiz Germano[1]

José Renato Nalini[2]

Thomas Nosch Gonçalves[3]

Os mecanismos de identificação proporcionam uma “segurança jurídica” na formação das relações negociais e existenciais. Com o passar dos anos, tais mecanismos foram alterados, com a inserção de novas tecnologias que nos permitem, com margem de engano muito menor, identificar pessoas. São exemplos disso a identificação biométrica em diversas formas (leitura facial, íris, impressão digital, curvatura das mãos, voz), além das certificações digitais – avançada, qualificada e simples – Lei 14.063/2020.

O desenvolvimento e a implantação dessas tecnologias tornaram obsoletas ou pelo menos defasadas, as formas analógicas e pouco seguras de identificação. Por esse motivo, as alterações normativas que visam a facilitar ajustes registrais, sem que isso gere insegurança jurídica – pelo contrário -, acabam gerando um encadeamento eletrônico registral.

O art. 109, da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973 (Lei dos Registros Públicos), prevê a possibilidade de que o assento seja retificado, devendo o juiz ordenar a expedição de mandado específico para isso. O art. 56 da Lei 6015/73 autorizava sua modificação em um prazo decadencial de 1 ano, após a pessoa atingir a maioridade. No entanto, é importante salientar que a ideia de imutabilidade do nome alterou-se sensivelmente nos últimos anos.

Nessa senda, é importante analisar o tema dos direitos da personalidade com vetor axiológico constitucional do supra princípio da dignidade da pessoa humana. Para o STJ, inclusive, as exceções ao princípio da imutabilidade do nome expressas na Lei de Registros Públicos (6.015/1973) são meramente exemplificativas. É possível que o juiz determine a modificação, se entender que existe o constrangimento ou exposição ao ridículo.

A análise indubitavelmente subjetiva deve ser realizada sob a perspectiva do próprio titular do nome. Em estudo do saudoso notário Zeno Veloso, no site portal do Instituto Brasileiro de Direito da Família (IBDFAM), tivemos a oportunidade de tratar desse tema, defendendo a necessidade releitura da alteração do nome.

Logo de início, é importante estabelecermos que o nome civil da pessoa natural é um direito da personalidade que deve ser analisado pelo vetor axiológico da dignidade da pessoa humana, conforme a Constituição Federal, o que causa uma releitura do princípio da sua imutabilidade. O fato é que esse princípio vem sendo corretamente mitigado. O princípio hoje deve ser considerado como da mutabilidade motivada, pois diversos julgados do STJ têm feito a relativização da imutabilidade, já é um movimento quase que unânime de mitigação desse princípio, baseado numa análise principiológica do ordenamento jurídico.

Conforme destacado inicialmente, a Lei de Registros Públicos, do já distante ano de 1973, previa a possibilidade de alteração do prenome no período de um ano a partir da maioridade, sem tanta necessidade de fundamentação para essa mudança. Também existe a possibilidade de mudança em casos de filiação socioafetiva de enteado, adoção, casamento e união estável, prenome imoral ou de exposição ao ridículo, nome notório ou pseudônimo, entre outras situações. Mais recentemente, é preciso destacar o Provimento 73 do Conselho Nacional de Justiça – CNJ, que possibilitou a alteração de prenome e gênero sem necessidade de cirurgia, tratamento hormonal ou mesmo de judicialização.

Essa releitura vem sendo desenvolvida há tempos pelo professor Anderson Schreiber no tocante aos pedidos de modificação do nome, sustentando ele que se trata de medida isonômica a possibilidade de alteração de nome em outros casos. Segundo o especialista, não é o acolhimento, mas a rejeição ao pedido de alteração que depende de motivo suficiente, sempre observando o respeito à personalidade e à autodeterminação pessoal. Estudos e artigos recentes também apontam a necessidade de legislação específica e atualizada sobre o tema. E foi exatamente o que aconteceu com a Lei 14.382 de 27 de junho de 2022.

Em que pese alguns afirmarem equivocadamente que há risco para a segurança jurídica na alteração do nome, não nos parece ser assim, pois é sabido que nossa Lei de Registros Públicos é de 1973. Era um momento totalmente diferente para a identificação civil e também para a tecnologia disponível.

Além disso, há recurso disponível para afastar insegurança jurídica, como o Cadastro de Pessoa Física – CPF, meio eficaz de identificação da pessoa natural, o que afasta as narrativas de potenciais fraudes contra credores ou prejuízos a terceiros, ainda mais hoje em que o CPF é atribuído nos primeiros dias ou primeiras horas de vida da pessoa natural!

Não é demais lembrar que a alteração legislativa só permite, em regra, uma única mudança do nome, só que agora sem limitar essa possibilidade ao primeiro ano da maioridade, quando a pessoa não raro não tem a maturidade e conhecimento necessários para isso. Agora, pode essa única mudança extrajudicial ocorrer a qualquer tempo, uma vez só, salvo decisão judicial em contrário.

Portanto, com toda essa salvaguarda, é forçoso convir que a alteração não traz insegurança jurídica. Ao contrário, ela concretiza direitos fundamentais, pois todos precisamos nos reconhecer com a nossa identidade, da qual o nome faz parte, entalhando-se uma nova fase, a mutabilidade extrajudicial.

Mas, caso ainda paire dúvida sobre os riscos da alteração e suspeitar de fraude, falsidade, má-fé, vício de vontade ou simulação quanto à real intenção da pessoa requerente, o oficial de registro civil fundamentadamente recusará a retificação. Com efeito, aconselha-se apresentação de certidões do requerente, lembrando que o CPF continuará o mesmo, afastando hipótese de prejuízo para terceiros, deslocando mais uma importante função para os registros públicos, a verificação da identidade.

Por fim, cabe prognóstico registral na medida em que a alteração pode reverberar em outros assentos registrais, após a finalização do procedimento de alteração no assento, o ofício de registro civil de pessoas naturais no qual se processou a alteração, a expensas do requerente, comunicará o ato oficialmente aos órgãos expedidores do documento de identidade, do CPF e do passaporte, bem como ao Tribunal Superior Eleitoral, preferencialmente por meio eletrônico, além de observar assim as retificações, anotações e comunicações específicas em todos outros atos, para assim, evitar riscos e conflitos registrais. 

[1]Especialista em direito notarial e registral pela EPM, Desembargador aposentado (TJ/SP), atualmente é Oficial de Registro de Imóveis do 2º Ofício de Cianorte – Paraná. 

[2]Doutor e Mestre em Direito pela USP, Desembargador aposentado, Ex-Corregedor Geral da Justiça, Ex-Presidente (TJ/SP) e Reitor da Uniregistral. 

[3]Mestre em Direito pela USP, especialista em direito civil pela USP e em direito notarial e registral pela EPM, ex-advogado e atualmente Registrador Civil e Tabelião de Notas do Distrito de Cachoeira de Emas, Município de Pirassununga em São Paulo.

Fonte: IBDFAM

 

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